A porção Bo discute os tefilin, ou filactérios, que são usados na cabeça e no braço, dizendo que os colocamos para nos recordar dos milagres que o Criador realizou antes, e durante, a Redenção do Egipto. Em outros lugares da Torah onde se fala de ações físicas, dizem-nos também que, ao fazê-las, devemos recordar-nos dos milagres da Redenção do Egipto.
“Qual é a finalidade destes milagres?”
Sabemos que tudo o que está escrito na Torah tem um propósito; qual é, então, a importância de nos lembrarmos constantemente destes milagres?
O grande kabbalista e comentador Rav Moshe ben Nachman, o Ramban, explica esta ideia no seu comentário à porção Bo: “A partir dos grandes e conhecidos milagres, devemos compreender os pequenos milagres. Esta ideia é a base de toda a espiritualidade e ligação com a Luz do Criador. Uma pessoa não tem uma verdadeira ligação com o Criador a menos que compreenda que tudo o que ocorre é um milagre”.
É uma lição extremamente importante; os kabbalistas ensinam que a Luz do Criador é revelada a uma pessoa dependendo da sua compreensão do Criador. Simplificando, quanto mais uma pessoa está consciente e certa da presença da Luz do Criador, mais ela atrai a Luz do Criador – é o recipiente que atrai a Luz. Pelo contrário, na medida em que uma pessoa carece da consciência do Criador, é na medida em que lhe falta uma ligação com a Luz.
“A Luz do Criador é revelada a uma pessoa, dependendo da sua compreensão do Criador”.
Uma das maiores razões porque às vezes esquecemos a existência do Criador é porque menosprezamos as coisas vendo-as como algo da”natureza”, tomando-as como garantidas, quando na verdade, são milagres.
Vemos o sol nascer de manhã e pôr-se à noite, vemos um sistema que parece funcionar mecanicamente e por si só, mas precisamos de nos lembrar que o sol nasce e se põe por causa do Criador, e não há realmente diferença, de facto, entre milagre e natureza, porque a natureza é simplesmente milagres constantes.
Mas qual é a finalidade destes milagres?
Não acontecem, explica o Ramban, simplesmente para o milagre em si. Pelo contrário, ocorrem para nos recordar a existência do Criador, da Luz, e das bênçãos. A razão por que acordamos de manhã, por exemplo, é porque o Criador diz à nossa alma para reentrar no nosso corpo; é um milagre.
O Ramban ensina, portanto, que quando lemos as secções da Torah que lidam com milagres, ou quando fazemos ações destinadas a lembrar-nos dos diferentes milagres do Criador, o seu propósito não é simplesmente recordar. Mais importante ainda, lemos ou falamos estas secções e fazemos estas ações repetidamente para instilar e reforçar na nossa mente que tudo é um milagre.
Como tal, aprendemos através da porção de Bo que quando estamos a ler as seções na Torá que falam sobre os milagres do Criador, ou a fazer as ações espirituais que nos lembram esses milagres, devemos fazê-lo com a consciência e o desejo de que eles fortaleçam a nossa consciência do Criador. Porque, ao fazê-lo, podemos construir e manter cada vez mais uma verdadeira ligação à Luz.